Suspeito que esta série, que servirá de suporte a um pequeno ensaio, vai trazer-me muitos amigos. O título provocador permitirá aos descerebrados dizer que eu comparo a luta pela igualdade racial no Mississipi aos desmandos da antiga Moscovo.
A igualdade parece ser o único valor moral objectivamente universal na exportável cultura do Ocidente e criticá-la deverá fazer-me sentir um pequeno De Las Casas diante de inquisidores impiedosos. Tanto pior. Digo parece, porque quando examinarmos as coisas mais de perto veremos que não é bem assim.
A igualdade parece ser o único valor moral objectivamente universal na exportável cultura do Ocidente e criticá-la deverá fazer-me sentir um pequeno De Las Casas diante de inquisidores impiedosos. Tanto pior. Digo parece, porque quando examinarmos as coisas mais de perto veremos que não é bem assim.
A investigação compreenderá todos os contributos, mas prestará especial atenção aos tempos de hoje. É óbvio que os efeitos actuais obtiveram a força noutras épocas - e não me esconderei - , mas seguirei um conselho de Ostrogorski: a melhor forma de estudar as forças políticas é estudar os métodos políticos. E os métodos são visíveis.
A promoção da igualdade a valor objectivo e universal é bom? Veremos. Em muitos casos não é bom, é óptimo. As intenções de mencheviques e bolcheviques eram adoráveis. Também o Terror começou por ser uma reacção de desespero de gente sem pão ( a 4 de Setembro) , depois passou pela necessidade de todos os cidadãos terem armas para implementar a igualdade e chegou à obrigatoriedade do tratamento por citoyen para quem não quisesse iniciar o percurso para a lâmina (1). Os problemas, como em todo os projectos políticos, moram nas consequências.
Veremos também como a agenda igualitária tem muitas páginas arrancadas. Um indíviduo cerra os dentes em Lisboa pelo direito de casais de PMS à parentalidade , mas diz preferir Teerão a Nova Iorque; outro exige um Estado laico em Madrid , mas não quer sombra do modelo democrático ocidental ( que pretende em Madrid) em Kabul, onde as viúvas dos mujahideen morreram à fome dentro de casa quando os soviéticos partiram. É natural que interesses diversos confluam na mesma direcção política, mas já é muito suspeito quando o valor moral é depois brandido como objectivo e universal.
Para além de páginas arrancadas, existem páginas acrescentadas que vêm de outras agendas. Nem sempre, mal ou bem, é a igualdade que está em causa. Veja-se a as actuais recepções ao Papa, ou a obliteração dos nomes religiosos de históricas freguesias urbanas, em nome da laicidade do Estado. O que está em causa é existir uma influência, ainda poderosa, de um código moral que execra as reinvidicações da agenda igualitária. Não é a igualdade que as recepções e obliterações reinvindicam, é a totalidade. Isto acontece noutras agendas, é um velho método. Veja-se o caso das campanhas anti-tabágicas. Se o objectivo é impedir que fulano jante a lerpar com o fumo de beltrano, por que motivo vão depois a correr apagar das fotografias o charuto do velho Winston?
O argumento de fundo que pretendo testar é o de que a igualdade deixou a sua inspiração libertária para passar a fazer um mau uso da liberdade positiva. Pretendo estudar as consequências desse mau uso, sobretudo as que afectam o equilíbrio de estruturas lentamente segregadas - como a família, a maternidade ou a religião - e a própria... liberdade.
1) Segundo Doyle, entre Outubro e Janeiro apenas 177 pessoas tinham sido executadas em Paris. Entre Novembro e Abril, em Lyon, foram executadas ( à bala) 1880 almas. A igualdade enfraquecia na periferia...
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