terça-feira, 27 de março de 2012

LIGA LIVRE (II):

Uma regionalização não serviria para nada. Seria apenas o prolongamento das formas de dominação burocrática a partir de novos centros. Não por acaso, quase todos os que  a defenderam, nos últimos anos,  estão agora satisfeitos em Lisboa ou endividados a Lisboa. A única regionalização possível nascerá de partidos locais. A seu tempo.
Em certas situações, as classes sociais separam-se dos seus partidos tradicionais. Este divórcio reforça o poder  da burocracia civil, da alta  finança, da Igreja e, em geral, de todos os corpos relativamente independentes da flutuação da opinião pública ( Gramsci, Quaderni). A crise de autoridade que se abre  faz com que a classe  dirigente  tradicional* reabsorva o controlo  - talvez faça sacrifícios e se exponha a um futuro incerto através de promessas demagógicas, mas retém o poder e usa-o para esmagar  os seus adversários e dispersar os seus melhores quadros  ( Gramsci, Quaderni). 
É vantajoso verificar como a descrição  não está desactualizada. O exemplo português pode ser bispado em muitos  pontos  - o leitor que  interprete como quiser.  O que me interessa é constatar como  a centralização - o cesarismo gramsciano - floresce nestes tempos.
Os media, por exemplo,  são uma peça fulcral no controlo centralista e um dos tais corpos independentes da flutuação  da opinião pública. Por irónico que seja, ela é alheia aos critérios editoriais, à dança de directores, à filiação partidária, ideológica e simbólica  dos jornalistas. Os principais  telejornais dão o prime time  à visão lisboeta  ( ou proto-lisboeta, no caso do Porto) da realidade ( vg o exemplo da recente greve geral).
No plano cultural, em sentido lato, a coisa  é igual. A abordagem de questões de costumes, do impacto de políticas do quotidiano ou da agenda espectacular, é sempre feita sob a batuta  da classe central dirigente. Em certas matérias, esta deixa caminho  livre ao cesarismo rive gauche extraído das escolas  de sociologia e de comunicação social lisboetas. É por isso que  certos temas parecem ser graníticos - LGBT, Palestina etc - e outros de esferovite - a segurança, o narcotráfico, a solidão dos fracos  e velhos. 

( cont.)

* O exemplo dos deputados-filhos-de-políticos que saíram  da escola directamente para o parlamento, os velhos senadores que dizem uma coisa com o chapéu de político e outra  com o de administradores etc.

Sem comentários: